MODIFICAÇÕES DA LEI NO CAMPO CONTÁBIL E PATRIMÔNIO LÍQUIDO

Prof. Dr. Antônio Lopes de Sá

A nova lei que modificou a das sociedades por ações, editada no apagar das luzes de 2007, vem ensejando interrogações.

Obviamente muita coisa será regulamentada e normatizada, mas, existem outras que só mesmo outra lei poderá disciplinar.

Uma delas refere-se à questão do “Patrimônio Líquido”, este sobre o qual alguns comentários já se fizeram editar, inclusive de minha autoria.

O que na realidade é “capital próprio”, tal como na comunidade européia a maioria acertadamente qualifica, recebeu a denominação “Patrimônio Líquido” em nossas leis por influência da visão de “direitos” e “obrigações”.

A intervenção da metodologia do Direito na Contabilidade vem de longa data.

A doutrina “personalista” nos conhecimentos contábeis, aquela que foi liderada na Itália pelo célebre cientista Giuseppe Cerboni, seguiu a tendência referida.

Conseguiu no Brasil fazer adeptos famosos, dentre eles o eminente professor de professores Carlos de Carvalho.

Foi essa disposição de pensamento a que influiu para considerar como “Patrimônio Líquido” a diferença entre posses (Ativo) e dívidas (Passivo).

Vários escritores anglo-saxões também seguiram tal tendência desde os fins do século XIX.

Passados já dois séculos e o tema volta a efervescência em nosso País, mesmo diante de toda a modernidade na doutrina e na técnica pela qual passou a Contabilidade.

A Lei nº. 11.638/07 estabelece o que se deve classificar nos balanços e o fazendo contraria o que durante séculos se consolidou, quando exclui alguns elementos reais do capital próprio.

Dessa forma, dentre as exclusões relevantes estão as Subvenções e os Lucros Acumulados, fatos não mencionados expressamente na Lei referida, mas, efetivamente existente na vida das empresas.

Quanto aos Lucros Acumulados já comentei em artigo especial que se encontra em nossa página www.lopesdesa.com.br.

No que tange a Subvenções, todavia, cumpre destacar que se trata de um assunto não menos relevante.

As aludidas, quando procuram estimular atividades, sendo oriundas de recursos ou fundos dos poderes públicos possuem caráter econômico especial, representando acréscimos patrimoniais efetivos, condicionados.

Ninguém pode negar que tais fatos representem acréscimo da riqueza em movimento, mas, submetidos compromissos de investimentos.

Na “essência” as subvenções possuem caráter reditual, pois não se derivam originariamente de atos da gestão, mas, sim de uma obrigação social ou econômica de realização de objetivos de interesse coletivo cuja decisão quanto a existência dimanou de fonte externa face a empresa.

Não é o empresário quem cria a subvenção e nem o recurso foi gerado por ele.

Trata-se de um fenômeno específico, como tal assim classificado por eminentes cientistas da Contabilidade (Masi, Zappa, Paton, Kester etc.).   

Os poderes públicos, por um critério de conveniência, transferem às empresas ou instituições o cumprimento de programas, como, por exemplo, os de desenvolvimento de uma região e, em tal caso, favorecem os executores e se favorecem por desonerar de aplicações maiores.

Trata-se geralmente de uma parceria na qual a fonte é o Estado.

Deriva-se de interesse recíproco – da empresa que executa e do governo que transfere recursos.

Ao cumprir o que a Lei nº. 11.638/07 estabelece, se as subvenções forem consideradas como Reservas de Lucros, para integrarem o Patrimônio Líquido, o governo estará dando recursos e da própria doação tirando recursos, ou seja, descaracterizando o incentivo.

O fomento, por exemplo, à indústria, esta que cria emprego e paga impostos perderá em boa parte o seu efeito e estará consagrada desta forma uma lesão ao próprio interesse nacional.

Por outro lado ocorrerá uma deformação conceitual no campo científico da Contabilidade, pois, subvenções não possuem como causa a natureza do rédito operacional no que tange à sua concepção.

Os efeitos dela, sim, gerando a movimentação da riqueza, ensejarão receitas, mas, a subvenção por natureza não se caracteriza como tal.

Não é o capital que gera a subvenção.

O conceito de rédito se prende ao fato de derivar-se do capital.

Tudo no patrimônio tende à transformação, mas, cada fato se qualifica por sua natureza de causas e efeitos.

O privilégio da subvenção se contrapõe ao dever de execução de metas que não são as definidas “ab ovo” pelo empreendimento particular.

A natureza de tal fato, pois, não é a reditual, embora por efeito possa vir a ensejar o rédito.

Como no Patrimônio Líquido (Capital próprio) o que se visa a apresentar são as “causas” ou recursos que sustentam aplicações, é a natureza do fato a determinante.

Essa forma de entendimento tem sido a aceita cientificamente porque à ciência só a realidade interessa, ou seja, o que é “objetivo” e de alcance universal.

O “subjetivo”, entretanto, apresenta como realidade aquela que está no limite de alcance da visão particular, esta que no caso parece ter sido a da Lei nº. 11.638/07 quanto ao evento referido.