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01/12/2010
Empresa tem gratuidade da justiça com baixo faturamento
 
(DCI / SP) Uma empresa de São Paulo conseguiu na Justiça do Trabalho algo extremamente raro: o Tribunal Superior do Trabalho (TST) reconheceu que a empresa tinha direito à gratuidade da justiça, ou seja, não precisaria pagar o depósito prévio para recorrer. Isso porque ela comprovou de forma detalhada que não teria como arcar com o valor de R$ 3.800, referente à ação rescisória que ajuizou ao recorrer em um caso de indenização para um ex-empregado.

O relator do caso na seção especializada em dissídios individuais do TST, ministro Pedro Paulo Manus, afirmou que a gratuidade de justiça vem sendo admitida de forma cautelosa para pessoa jurídica. Ela está condicionada, no entanto, "à demonstração cabal e inequívoca de que a empresa não pode arcar com as despesas do processo sem que, com isso, prejudique seu funcionamento e administração".

A Trieme Marine Equipamentos Náuticos, que responde à ação desde 2009, comprovou que em seis meses de sua receita de 2008 o faturamento foi menor que o valor do depósito, atendendo a exigência para a gratuidade.

Para o advogado José Augusto Rodrigues Jr. do escritório Rodrigues Jr. Advogados, a decisão indica uma nova interpretação que pode se sedimentar.

"A justiça vem entendendo que o empregador deve assumir o risco do negócio e fazer o depósito. Mas a decisão, que isentou em ação rescisória, pode ser alargada e usada em todos os depósitos recursais", diz o advogado. O depósito recursal existe para garantir que, em uma futura condenação, o empregado receba algum valor.

Rodrigues lembra que o próprio Supremo Tribunal Federal (STF), presidido por Cezar Peluso, já pacificou que as empresas não são obrigadas a fazer depósito integral do valor de autos de infração para recorrer em processo administrativo.

A decisão do TST, segundo o advogado, vai contra a jurisprudência, que tem apenas decisões esparsas reconhecendo a gratuidade, mas que são frequentemente reformadas nas instâncias superiores. "É um novo rumo para a jurisprudência e uma tendência que vai se firmar em nome do princípio maior da ampla defesa", afirma.

Opinião diversa tem o advogado Alan Balaban Sasson, do Valentim, Braga & Balaban Advogados. A decisão, "raríssima", não vai "pegar tão fácil" segundo o especialista. "Ela é interessante, mas as micro e pequenas empresas não podem se valer dessa tese. Não há uma súmula ou entendimento pacificado. É preciso aguardar outros casos para manifestação do Tribunal", diz Balaban. O advogado afirma que as empresas que passam por dificuldades e têm como provar devem tentar a isenção e ver como os tribunais vão receber os casos.

Maria Lucia Benhame, sócia do Benhame Sociedade de Advogados, concorda que as empresas podem começar a usar o acórdão do TST para pedir a gratuidade, mas também não vê "regra nem tendência" nesse sentido. "É um caso isolado, infelizmente, porque quando não se consegue discutir um caso no Judiciário viola-se o direito constitucional do acesso, o direito de ação e a ampla defesa é cerceada", diz.

O advogado Gustavo Domingues Quevedo, do escritório Bastos-Tigre, Coelho da Rocha e Lopes Advogados, afirma que negar o acesso à justiça viola outro princípio: o da isonomia, ou seja, as partes devem ser tratadas de forma igual. "Os tribunais estão baseados na premissa de que apenas a pessoa física é hipossuficiente, em detrimento da pessoa jurídica. A Constituição Federal não faz distinção e garante o amplo acesso", destaca o advogado, que também aposta que a justiça do trabalho e a comum não devam mudar sua jurisprudência.

No caso, a empresa foi condenada em 2007 a indenizar em R$ 60 mil e pagar pensão vitalícia a um empregado que amputou três dedos da mão em acidente de trabalho. No recurso, alega, com novas provas, que o funcionário recebeu equipamento de proteção e que o acidente ocorreu em uma festa de confraternização, quando não havia expediente.

A empresa disse não ter respaldo financeiro para o depósito e juntou o recibo de entrega da declaração anual do Simples Nacional e de miserabilidade jurídica.

Ela afirmou que o artigo 836 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) não faz distinção entre pessoa física e pessoa jurídica para que se peça a isenção do depósito prévio. O argumento foi aceito pelos ministros do TST na decisão de final de outubro, mesmo o relator lembrando que o entendimento predominante do Tribunal é que não se aplica à pessoa jurídica a justiça gratuita, "cabível, via de regra, apenas para a pessoa física". A ação, extinta sem resolução de mérito, deve voltar ao Tribunal Regional de São Paulo.
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